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segunda-feira, 6 de agosto de 2012

A Praça I

Neste meu narrar desconjuntado, em que a memória salta de um para outro tempo, de um para outro lugar e de um para outro momento, apenas pela lógica do que me recordo, coisas que surgem por contraste ou porque me impressionaram, ou ainda por justaposições de que mal entendo a razão, acontece-me por vezes recordar, neste vaivém de lembranças, pequenos factos que tiveram talvez importância decisiva, e que naturalmente acabaram por fazer de mim o que sou hoje. A verdade é que nos vamos fazendo com milhões de pequeninas coisas. É em tudo o que se vai processando pela vida fora que descobrimos o que somos (ou julgamos ser) e se forma a nossa visão do mundo.

Hoje, estou plenamente convencido de que foi num pequeno episódio que me aconteceu na Praça que surgiu em mim uma grande transformação na minha postura perante a vida. E que Praça? A Praça da República, de que já aqui falei mais vezes e que é chamada simplesmente a Praça, porque ... não existia mais Praça nenhuma em Vila Flor! A Praça onde quase tudo acontecia nesse tempo :-))

Antes de contar este pequeno episódio convém  referir que ele me transformou completamente, modificando e abafando aquela rebeldia e anárquica vivência que até aí tinha sido o meu dia-a-dia. Nesse tempo era considerado pelos professores do Colégio que frequentava o aluno baldas que só lia e estudava o que lhe interessava. O aluno que era capaz de discutir com os professores questões de um nível superior para a sua idade biológica nas áreas da sociologia, psicologia e mesmo história, mas que no conteúdo curricular obrigatório era apenas medíocre. Tanto assim que acabara de reprovar no exame do antigo 5º ano que fizera no Liceu Nacional de Bragança e, durante esse mesmo ano lectivo, tinha sido suspenso das aulas durante três dias por ter recusado pedir desculpa à criada do Padre Cassiano Dimas Fais (que era também o Director do Colégio), só porque lhe tinha mandado uns piropos brejeiros. Por outro lado, acabara de ganhar um prémio de cultura geral num concurso de rádio promovido pela Emissora Nacional, a que concorrera por escrito uns meses antes.

Passemos então ao episódio. 
Naquela tarde de um dia do mês de Julho, depois de ter lido, num dos bancos da Praça mesmo debaixo de uma das frondosas tílias que aí havia, juntamente com o Abel Salgueiro (grande amigo e infelizmente já falecido) e com o Tino Navarro (que é, hoje em dia, um dos mais prestigiados produtores de cinema do nosso País) o Jornal "A Bola", que nos tinha sido emprestado pelo Senhor João "Ourives", dirigia-me para casa triste, pensativo e sorumbático. 

Os tempos estavam difíceis, andava desmoralizado, descrente de mim e da vida. Revoltado com os professores, com o Padre, com o Presidente da Câmara (que era também meu professor de Matemática e o único médico da Vila!!!) que, depois de nos chamar ao seu gabinete da Câmara(!) obrigara recentemente meu pai a pagar uma lâmpada de um candeeiro de rua, que eu, de facto, tinha partido com um chumbo, quando dei um tiro com a arma de pressão que o Paulo "Pisco" me tinha emprestado para ir aos pássaros. De repente, ainda na Praça e já muito próximo da Farmácia Vaz, pára, mesmo a meu lado, uma carrinha comercial cujo condutor me pergunta lá de dentro com uma pronúncia tripeira: "pssst ... ouve lá, tu também és gago"?
- Hããããã!!!! Que raio de pergunta é essa?! Perguntei eu rispidamente, apanhado assim de surpresa.
 (continua...)

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